As palavras desse famoso hino de John Newton parecem ressoar em pessoas de todas as convicções teológicas: ele é cantado em igrejas de todos os tipos, desde cristãs evangélicas, católicas romanas, liberais e mórmons. Foi gravada por inúmeros artistas, desde Johnny Cash e Elvis Presley até os Três Tenores, Rascal Flatts e Alan Jackson. O conceito (ou pelo menos a palavra) de graça está firmemente plantado em nossa cultura.
O conceito de graça, conforme encontrado na Bíblia, é multifacetado, mas pode ser resumido na definição "favor imerecido". A Bíblia diz que somos salvos pela graça. A graça de Deus é expressa pelo perdão de Deus aos nossos pecados, e Suas bênçãos para nós incluem paz e realização nesta vida e, na vida futura, comunhão livre com Ele por toda a eternidade. Assim como a música "Maravilhosa Graça" ganhou aceitação quase universal, é difícil encontrar qualquer expressão religiosa com raízes no cristianismo que não exalte as virtudes da graça. Ninguém que tenha tido um mínimo de contato com o cristianismo seria tão crasso a ponto de afirmar que viveu uma vida de caráter tão excelente que Deus lhe deve a vida eterna. A grande maioria admitirá que tem falhas e que precisa da graça de Deus de alguma forma.
Entretanto, há muitos mal-entendidos sobre ser salvo pela graça. Muitos dos que se dizem cristãos presumem que a graça de Deus estabeleceu um sistema pelo qual o pecador possa mitigar sua merecida punição por meio de seus próprios esforços. Para alguns, esse pode ser um sistema formal de sacramentos que infunde a alma com a graça de Deus. Para outros, o sistema é menos formal, mas ainda assim inclui várias atividades religiosas, como a frequência à igreja, o batismo, a contribuição para a oferta e a prática de boas ações. Embora a maioria concorde que "ninguém é perfeito", muitos dizem que Deus, em Sua "graça", não levará em conta nossos pecados se perceber que fizemos um esforço genuíno para fazer a coisa certa, corrigir nossos caminhos e nos valermos da ajuda que Ele oferece por meio da igreja - se Ele perceber que a trajetória de nossa vida está indo na direção certa, então, em Sua "graça", Ele perdoará nossos pecados e nos concederá a vida eterna. Nessa visão da "graça", o pecador não ganha a vida eterna em um sentido absoluto, mas sua resposta penitente e seu esforço genuíno desencadeiam uma resposta graciosa do Pai. Essa crença, embora muito difundida, contradiz o verdadeiro significado da graça ("favor imerecido").
Este exemplo pode ajudar a ilustrar a visão acima sobre a graça: um adolescente trabalha duro durante todo o verão para economizar dinheiro para comprar um carro. Ele tem um emprego regular e faz trabalhos no quintal e biscates. Ele economiza seu dinheiro e não o gasta frivolamente. No entanto, no final do verão, ele simplesmente não tem dinheiro suficiente para comprar um carro que atenda às suas necessidades. Seu pai, vendo sua diligência e frugalidade, intervém graciosamente e não apenas compensa a diferença, mas também acrescenta mais dinheiro
à reserva do carro para que o filho possa comprar um carro melhor do que ele imaginava poder comprar. O melhor esforço do filho não foi suficiente, mas a graça do pai compensou a diferença. Ninguém diria que o pai era obrigado a compensar a diferença, portanto, quando ele o faz, é um ato de graça. Se o filho tivesse sido demitido do emprego por chegar atrasado, se tivesse ficado na piscina todos os dias em vez de trabalhar ou se tivesse gastado o dinheiro que tinha em fast food e videogames, o pai não teria entrado em cena para compensar a diferença. Seria incorreto dizer que o filho "ganhou" o carro, pois ele não ganhou, mas seu esforço provocou uma resposta graciosa do pai.
De acordo com a Bíblia, isso é realmente graça? A resposta é NÃO! Graça é favor imerecido; é a bênção de Deus para quem não é digno. No exemplo acima, o pai concedeu seu favor porque sentiu que os esforços do filho deveriam ser recompensados - o presente do pai foi baseado em um esforço genuíno do filho e, portanto, não era a verdadeira graça. Jesus ilustrou a verdadeira graça com a história de um pai que recebeu seu filho fugitivo com uma alegria festiva - um indivíduo totalmente indigno que não trouxe nada para o pai, exceto desonra e vergonha, foi agraciado com bênçãos imerecidas (Lucas 15:11-24).
Somos salvos pela graça, não por uma mistura da graça de Deus com nossas obras meritórias. De acordo com as Escrituras, não podemos fazer nada para merecer a salvação, nem nossos melhores esforços são bons o suficiente para provocar uma resposta graciosa de Deus, de modo que Ele compense a diferença. Todos os nossos atos de justiça são como trapos de imundície (Isaías 64:6). Mesmo considerando nossos melhores esforços, ficamos aquém do padrão de justiça de Deus (Romanos 3:23) e merecemos a morte (Romanos 6:23). Não fomos ordenados a "fazer o melhor" para Deus, mas a amá-lo perfeita e completamente (Mateus 22:37). Nós falhamos nisso. O mandamento não é "tentar" amar o próximo, mas conseguir de fato amar o próximo como amamos a nós mesmos (Mateus 22:39). Apesar de nossos "melhores esforços", falhamos - e quem pode afirmar honestamente que deu o seu "melhor esforço"?
Muitas vezes, as pessoas tentam consolar aqueles que percebem suas falhas dizendo algo como: "Não tenha medo - Deus conhece seu coração", como se isso fosse um consolo. Se Deus conhece nosso coração, estamos de fato condenados - não há mais lugar para nos escondermos! Nossa única esperança é depositar nossa fé em Jesus Cristo, que viveu uma vida perfeita, morreu na cruz para pagar por nossos pecados e ressuscitou. Nosso pecado é imputado a Ele, e Sua justiça é imputada a nós quando confiamos nEle (2 Coríntios 5:21). Somos justificados não por nossas obras (Romanos 3:20), mas pela ressurreição de Jesus (Romanos 4:25). A fé em si não é uma "boa obra" que faz com que Deus nos observe. A fé é o arrependimento de nossos pecados, a admissão de que estamos irremediavelmente perdidos e incapazes de fazer qualquer coisa para ganhar o favor de Deus e, então, simplesmente aceitar a salvação que Ele oferece gratuitamente.
Somos salvos pela graça; a obra é de Deus, não nossa. "Ora, o salário daquele que trabalha não lhe é atribuído como favor, mas como dívida. Contudo, ao que não trabalha, mas crê naquele que justifica o ímpio, sua fé lhe é atribuída como justiça" (Romanos 4:4-5). Aqui vemos duas grandes verdades. Em primeiro lugar, Deus justifica os ímpios - não as pessoas que fizeram o melhor que podiam e que, de alguma forma, obtiveram uma resposta graciosa de Deus. Deus justifica aqueles que não o merecem. Segundo, Deus justifica as pessoas que recebem a salvação pela fé - não as pessoas que se esforçam ao máximo. Se elas são justificadas em qualquer parte com base no que fazem, estão recebendo um salário, não um dom. Se a graça for baseada em obras em qualquer grau, então não é graça (Romanos 11:6).
Somos salvos pela graça do começo ao fim. Uma vez que uma pessoa tenha chegado à fé em Cristo, ela sem dúvida perceberá que a única razão pela qual foi capaz de ter fé é que Deus o estava atraindo antes mesmo que ele soubesse (veja João 6:44). Deixado por conta própria, o pecador teria continuado a se rebelar e a fugir de Deus. Mesmo antes de crermos, o próprio desejo de nos achegarmos a Deus é a graça de Deus em ação para nos salvar. "A salvação pertence ao SENHOR" (Salmo 3:8; cf. Apocalipse 7:10).
A salvação pela graça significa que, do início ao fim, ela é imerecida. Jesus é o Autor e Consumador da nossa fé (Hebreus 12:2). Graça não é Deus fazendo 95% ou até 99,9%, e nós compensando a diferença. Graça é Deus fazendo 100% e nossa humilde aceitação disso, reconhecendo que não somos dignos e não temos nada a contribuir.